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Nem por isso...

Trouxe-me o devaneio (depois da necessidade) a um bairro novo de Lisboa. A referência que faço a este bairro criado de raíz, em meados do século passado, numa área da cidade que era até aí local de quintinhas e baldios, nos arrabaldes duma Lisboa ainda muito concentrada junto ao Tejo, apresentava-se caracteristicamente perspassado de curtos e imperfeitas veredas e caminhos de terra batida. Aqui, ou ali, um muro, uma azenha velha, um vinhedo, a fileira de árvores que tinham em tempo marcado a entrada duma casa senhorial, um terreno ou outro arado e semeado, ou uma horta, poucas árvores de grande porte, mas muitos arbustos contornando os limites das escrituras. Quando as havia, claro. Algumas casas esparsas e pouco mais.

A fotografia que reproduzo (retirada da página Lisboa Secreta, de Inês Santos, 2019) é do Campo Grande. Uma fotografia aérea de c. 1934 e vem consignada a José Pedro Pinheiro Corrêa. Vale a pena determo-nos nela, por instantes. Anterior à construção da Cidade Universitária e do Hospital de Sta. Maria, cujo acesso abriria a Av. 28 de Maio, anterior ainda às edificações de Alvalade, que importariam a abertura das Avenidas de Roma e Estados Unidos da América. É, portanto, uma Lisboa do tempo entre as Gr. Guerras que ali se avista a partir da zona final do jardim, hoje cortada pela 2ª Circular, com a casa apalaçada das Avillez em primeiro plano e o palácio Pimenta um pouco mais acima, à direita. Olhemos antes para a esquerda, para o curto troço inicial da Av. do Brasil, então denominada Av. Alferes Malheiro, que se avista, e imaginemo-nos a subi-la, passando frente à casa edificada que se encontra à direita. Os terrenos que se seguem constituem aqueles que referi acima. Descreve-os também a municipalidade, ao fazer referência à sua expropriação e da Quinta dos Coruchéus, a fim de dar início à construção do bairro de Alvalade, para a qual remeto. Devemos muito ao arquitecto urbanista João Guilherme Faria da Costa (1906-1971). Formado em Portugal, mas com demorada passagem pela Europa, definiu com o seu traço a maior parte da nova Lisboa, edificada pelo Estado Novo. O Plano de Alvalade é de 1945. Em 1953 estava praticamente concluído.

A fotografia, de 53, é de Alberto Augusto de Abreu Nunes (Arq. Mun. Lx)

É sobre a parte mais distante do bairro que se vê na foto que se encontra a Rua Violante do Céu, porta de entrada para quem lá se dirige, vindo da Av. de Roma. E o aspecto que a mesma apresentava, por essa altura, era este:










Outros tempos, a mesma rua:


















O automóvel absorveu a paisagem citadina.






Recentemente:


Mais ordenada, sem dúvida.

Pergunto-me o que é que os moradores fizeram aos carros. Venderam-nos e passaram a andar de transportes públicos ? Não creio. Nem a Câmara acredita em tal, de certeza. Nem querem saber ! Esses transportes continuam tão mal, em termos de oferta, como há 20 e 30 anos atrás, se não mais.

O resultado para o tal ordenamento fez-se a favor dos serviços camarários e não dos moradores do local. Ali como em toda a Lisboa, aliás. Os moradores, que não venderam os carros, aparcam-nos cada vez mais longe de casa e pagam agora bem mais para os terem ali.

Que era necessário intervir, não temos qualquer dúvida. As dúvidas surgem-nos pelos métodos utilizados para o efeito. Mas isso são contos largos, que ficam para outra oportunidade. Por agora, resta frisar que o ambiente dos locais ganha em ordenamento e os seus habitantes têm ainda mais a ganhar quando o espaço próximo e o envolvente proporcionam bem-estar. Pretendo francamente sublinhar este ponto, pois considero que tem sido desprezado por todos, em geral, e pelos dirigentes e responsáveis camarários, em particular.

Proporcionar ambientes capazes, mais despoluídos, mais verdes, mais agradáveis, convidativos e bonitos são factores de grande peso na vivência citadina. Mais do que isso, são essenciais. E não é exagero nenhum dizer que é preciso habitações e espaços condignos e que proporcionem bem-estar, do mesmo moda que precisamos de comida e ar. A avaliação do peso que o meio exerce no dia-a-dia, na nossa disposição, é coisa que pouco se tem em conta. E a importância da sua influência psíquico-comportamental continua bem longe de ser considerada. Volto a afirmar que cuidar e manter o ambiente bonito e salutar concorre em muito para que possamos TODOS usufruir do Belo e de bem-estar. Para isso, o caminho terá que ser feito harmonizado e em comunhão de interesses: os dos moradores, fruidores cuidadosos do seu espaço, os da Câmara, entidade propiciadora e zeladora para que isso aconteça.

Elementar. ... Ou nem por isso ?



Sujidade, descuido, desreguardo, desleixo...


Portas, janelas, gelosias, persianas, fios, cabos, depósitos de correio, grades, telheiros...feio, feio!

fios atravessados, alumínio por todo o lado, também nas varandas (exíguas !) encerradas,

aparelhos de ar condicionado... horrível!

Fala-se de população envelhecida para justificar o desleixo...

Mas os edifícios têm manutenção das fachadas.


Quase todos foram

pintados e alguns

apresentam os espaços

ajardinados da frente bem

cuidados. A população envelhecida não é justificativo.


Tento entender que razão poderá haver que possa responder pelo mau gosto, ou falta dele...

Quer-me parecer que a indiferença estética dos portugueses, presentemente, é responsável pela alteração indiscriminada com que procedem à substituição das portas e portadas, janelas de madeira, por outras de alumínio, ou inox, frequentemente desiguais. Com a conivência da Câmara !














Em cima, a fachada pintada contrasta com as janelas e persianas que não houve o cuidado de uniformizar. A porta de inox e os fios enrolados, a subir, a atravessar... inaceitável.

Ao lado, os poucos exemplares de madeira que franqueiam a passagem para a rua, ladeados de recipientes para correio, telheiro, grades... !

Andei por toda a secção Este do bairro económico de Alvalade. Prédios iguais, ou semelhantes, de 3 andares, ajudam a criar harmonia de conjunto. Devo ter visto umas 80 portas. Dessas, apenas 3 são as de origem, em boa madeira.

Que tipo de serradura contagiosa invadiu a cabeça da maioria dos portugueses para fazerem substituições destas ? Não me venham com lérias de cartas que o correio não entrega por falta de acesso à caixa, ou empenos da madeira !! Parece que em Inglaterra, onde chove semana sim, semana sim, o carteiro encontra sempre gente em casa, que lhe abra a porta, e que a madeira inglesa não empena !

Haja Deus !

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